Por Lorena Villar, especialista em felicidade e bem-estar e sócia da Felicistart
Foto: Banco de imagens Freepik
Ao nos aproximarmos do final de mais um ciclo, a atmosfera costuma ser de reflexão e balanço. O final de ano é um convite intrínseco à avaliação: o que foi conquistado, o que ficou para trás, o que se espera do futuro. Nesse contexto, a perspectiva da psicologia positiva oferece lentes valiosas para enriquecer essa análise, focando não apenas nas métricas convencionais, mas no florescimento humano em sua totalidade. Para isso, vamos mergulhar na profunda intersecção entre a “Realização” (Achievement – A) do modelo PERMA de Martin E. P. Seligman e o “Bem-estar Emocional” (Emotional Well-being – E) do modelo SPIRE de Tal Ben-Shahar, destacando a importância de celebrar conquistas e esforços, e de nos concedermos a fundamental “permissão para ser humano”.
A Celebração da realização e do esforço: A força da conquista na virada do ano
Martin E. P. Seligman, em seu livro Florescer: Uma Nova Compreensão sobre a Natureza da Felicidade e do Bem-Estar, redefine a “felicidade autêntica” para uma visão mais abrangente de “bem-estar”, introduzindo o modelo PERMA. Um dos pilares cruciais desse modelo é a Realização (Achievement – A). Seligman argumenta que a realização é buscada por si mesma, independentemente de gerar prazer imediato, sentido ou bons relacionamentos. Ela se manifesta no desejo de dominar, vencer, ter sucesso e conquistar objetivos. Ele observa que:
“A realização (ou conquista) é buscada por ela própria, mesmo quando não produz emoção positiva, sentido ou relacionamentos positivos.”
Isso é particularmente relevante no final do ano, um período em que muitas vezes somos tentados a medir o sucesso apenas pelos grandes marcos ou resultados finais. No entanto, a perspectiva da realização nos convida a valorizar o processo, o empenho e a dedicação. A fórmula de Angela Lee Duckworth, citada por Seligman, é esclarecedora: “Realização = Habilidade x Esforço”
A parte do “esforço” é onde a magia acontece e onde a celebração ganha sentido, especialmente na retrospectiva de um ano. O esforço, por sua vez, é moldável e deriva de escolhas conscientes, autocontrole e, notavelmente, da GARRA, que é “a combinação de uma persistência elevadíssima e uma grande paixão por um objetivo”. Final de ano, portanto, é o momento ideal para reconhecer toda a garra empregada, as horas dedicadas a projetos, os desafios superados com tenacidade, mesmo que o resultado final não tenha sido o esperado.
Seligman também introduz o conceito da “virtude da lentidão”, contrastando-a com a velocidade. A lentidão, nesse contexto, permite processos voluntários e trabalhosos como planejamento, refinamento, verificação de erros e criatividade. No final do ano, essa “lentidão” se traduz na pausa para refletir sobre o ano, planejar o próximo, aprender com os erros e celebrar a criatividade e a resiliência que impulsionaram o progresso.
Celebrar os esforços e as pequenas vitórias é fundamental. O exercício de Seligman “O que correu bem?” nos encoraja a focar nos acontecimentos positivos e nas razões pelas quais eles ocorreram, cultivando uma “espiral ascendente de positividade”. Da mesma forma, a pesquisa de Shelly Gable sobre a resposta ativa e construtiva demonstra que a forma como comemoramos os sucessos, tanto nossos quanto dos outros, fortalece os relacionamentos. Ao final do ano, estender essa prática aos nossos próprios feitos e aos de nossos entes queridos não só valida o trabalho realizado, mas também nutre o bem-estar e a conexão. Cada passo, cada tentativa, cada persistência frente à adversidade do ano que se encerra, merece ser reconhecida.
A permissão para ser humano: Abraçando a totalidade das emoções na virada do ano
Tal Ben-Shahar, em Seja Mais Feliz, Aconteça o que Acontecer, propõe o modelo SPIRE de bem-estar, que inclui o Bem-estar Emocional (Emotional Well-being – E). Este pilar aborda a importância de respeitar e equilibrar os sentimentos, cultivar emoções prazerosas e, crucialmente, lidar com as emoções dolorosas. No final do ano, quando as expectativas de alegria e celebração podem ser altas, a “permissão para ser humano” de Ben-Shahar se torna um bálsamo.
Ben-Shahar desafia o mito de que a felicidade significa a ausência de emoções negativas. Ele argumenta que apenas “psicopatas e os mortos não vivenciam emoções dolorosas”. Portanto, sentir tristeza, raiva, frustração, ansiedade ou inveja é um sinal de que estamos vivos e somos humanos. A virada do ano, com suas memórias e expectativas, frequentemente evoca uma mistura complexa de sentimentos – alegria pelas conquistas, mas também saudade, frustração por metas não atingidas ou ansiedade pelo futuro. Negar ou reprimir essas emoções, como Ben-Shahar explica, apenas as intensifica, enquanto a aceitação ativa permite que fluam e se dissipem.
“A permissão para ser humano trata de se deixar sentir toda e qualquer emoção, por mais dolorosa que possa ser. Dar a si mesmo essa permissão é admitir: Estou sentindo isso agora, e tudo bem.”
As festas de final de ano podem amplificar tanto a euforia quanto a melancolia. A “permissão para ser humano” nos convida a acolher essa totalidade emocional. Em vez de lutar contra a tristeza que pode surgir ao recordar perdas ou o ano desafiador, podemos nos permitir chorar, conversar sobre o que sentimos ou até mesmo escrever em um diário. Essas práticas não são sinais de fraqueza, mas sim estratégias construtivas para processar emoções e fortalecer a resiliência psicológica.
A distinção entre “Eu sou triste” e “Eu tenho tristeza” é poderosa. Ela nos lembra que uma emoção é uma experiência transitória, não uma definição de nossa identidade. No final do ano, quando a autocrítica pode ser intensa, essa distinção nos ajuda a observar nossos sentimentos sem nos fundirmos a eles, permitindo-nos aceitar a impermanência de todas as emoções.
A conexão vital: Celebrando com permissão para ser humano no final do ano
A interconexão entre a realização e o bem-estar emocional é evidente na forma como celebramos e processamos o ano. Celebrar as conquistas e os esforços, grandes e pequenos, nutre o bem-estar emocional ao reforçar o senso de competência e valor. Ao final do ano, fazer uma retrospectiva consciente dos desafios enfrentados com “garra” e “autodisciplina”, e reconhecer os aprendizados, mesmo que dolorosos, fortalece nossa “antifragilidade”, a capacidade de ficar mais forte a partir da adversidade.
A gratidão, um tema recorrente em ambos os autores, funciona como uma ponte entre esses pilares. Seligman destaca a “visita de gratidão” e o exercício “o que correu bem?” como intervenções que aumentam a felicidade e reduzem a depressão. Ben-Shahar, por sua vez, ressalta o duplo sentido da palavra “appreciate” (em inglês): agradecer e aumentar de valor. No final do ano, praticar a gratidão – seja registrando em um diário, expressando verbalmente ou escrevendo cartas – não apenas cultiva emoções positivas, mas também valida os esforços e conquistas, permitindo que eles “cresçam em valor” em nossa percepção. É um momento de reconhecer não só o que foi alcançado, mas também as pessoas que nos apoiaram nessa jornada, reforçando os “relacionamentos positivos”, outro pilar do PERMA.
Ao final do ano, podemos nos sentir pressionados a apresentar uma imagem de sucesso e felicidade inabaláveis. No entanto, a psicologia positiva nos ensina que uma vida plena e feliz não é a ausência de desafios ou emoções dolorosas, mas a capacidade de abraçar a totalidade da experiência humana. Isso significa celebrar com sinceridade cada conquista, reconhecer cada esforço e, ao mesmo tempo, conceder-se a gentil permissão para sentir qualquer emoção que o encerramento de um ciclo possa trazer. Essa abordagem holística, que integra o reconhecimento do sucesso com a aceitação da vulnerabilidade, é o verdadeiro caminho para um florescimento duradouro e para uma virada de ano autêntica e significativa, aconteça o que acontecer.
Portanto, enquanto as luzes brilham e as esperanças se renovam, lembre-se: celebre cada vitória, honre cada esforço e, acima de tudo, permita-se ser humano. Essa é a essência do bem-estar e o alicerce para construir um futuro mais feliz e resiliente.

Sobre Lorena Villar
Lorena Villar é sócia da Felicistart, uma empresa inovadora que se destaca na promoção da saúde mental, bem-estar e felicidade corporativos a partir da aplicação de estudos e pesquisas cientificamente comprovados. Com uma sólida formação acadêmica e profissional, ela é certificada como Chief Happiness Officer e possui uma ampla experiência nas áreas de ensino-aprendizagem, treinamento e desenvolvimento humano.
Lorena é certificada em Felicidade Integral com Forças de Caráter e Ciências da Felicidade pelo Wholebeing Institute, além de ser Practitioner em A Trilha – Job Crafting pela Mapa de Talentos. Seu currículo inclui ainda a certificação em Comunicação Não Violenta pelo Instituto CNV Brasil e em Consultoria de Encorajamento pela Lynn Lott Consultant.
Sua expertise se estende à Gestão da Complexidade pela Refinne, Educação Sistêmica e Sucesso nos Relacionamentos e na Profissão pelo IDESV. Como educadora parental e em sala de aula em Disciplina Positiva, Lorena é formada pela Positive Discipline Association (PDA) e detém a certificação Green Belt pela FEBRACIS (Método CIS), atuando também como gestora de Perfil Comportamental, Business High Performance, Oradores e Palestrantes.
Atualmente, Lorena está ampliando seus conhecimentos e habilidades em Psicologia Organizacional e Gestão de Pessoas por meio de sua pós-graduação na PUC-RS.
Já atuou em multinacional na implantação e gestão de políticas e estratégias sociais, voluntária no TEDx Belo Horizonte e como professora e consultora, o que lhe traz dinamismo e flexibilidade de atuação.












